terça-feira, 12 de agosto de 2014

Espólio Sangrento - X

X - A sentença.

- Ele foi pego? Ele foi capturado? – Exaltou o gordo Sultão, sentando em seu trono mantendo agora um sorriso afortunado. Estava aliviado, satisfeito.

Caso Vlad III conseguisse fugir o Sultão estaria em um mal estado. A alguns quilômetros de distância do castelo. Hungáros e Turcos travavam uma sanguinolenta batalha, chamada depois de ‘’A cruzada de Varna’’.

Mehmed II manteve alguns soldados espiões nas terras de Valáquia e soube que Vlad Dracul mandará seu filho mais velho, Mircea para o campo de batalha, contra o seu exercito turco.
Traição? Jogo politico? Mehmed não soube ao certo. Informações que chegavam até ele diziam que: O Papa praticamente obrigara o príncipe de Valaquia se aliar aos cristões. 

Cobrando de Vlad II o juramento que fizera anos atrás a sua ordem cristã, A ordem do dragão.
Mehmed II ficara tranquilizado ao saber logo em seguida que o exercito cristão fora simplesmente massacrado. João Corvino conseguiu escapar, mas de forma nada honrosa, manchando para sempre a reputação dos cavaleiros brancos. Mircea, irmão mais velho de Vlad também conseguiu fugir, mas a derrota dos cristões para os turcos fazia o Sultão estremecer de felicidade. Estremeceu ainda mais ao saber que o garoto tinha sido capturado. Vlad II não se envolvera particularmente na batalha devido o estado dos filhos, Vlad III e Radu como reféns. Caso um deles fugisse, uma morte seria um pequeno efeito colateral diante uma grande vitória. Ou era assim que mehmed pensava, e acreditava que o príncipe da valáquia também.

- Reúnam todos os servos, todos os soldados, todos ser vivo que habita este castelo. Quero que nosso pequeno convidado tenha uma grande recepção. – Seu olhar era maldoso e sua voz soava como uma maldição..
~~
Vlad estava cansado, machucado. A viagem de volta a sua prisão demorou quase três dias. Eu andei isso tudo em um dia e meio? Não consigo acreditar.

Passaram por todos os pontos de paradas que Vlad passara outrora. Principalmente pela cachoeira, o local onde estava escondido o livro dos Não-Mortos. Não iria esquecer aquele local, jamais. Gravou todo o caminho com toda sua memoria e atenção. Assim que tivesse a oportunidade iria desenhar um mapa, para ter certeza que quando tivesse a oportunidade 
(fosse em outra fuga ou em liberdade) iria passar pelo local.

Seus devaneios tinham um ritmo fraco e simples. Livro dos Não-Mortos e o lobo de olhos vermelhos. Que criatura era aquela? Por que tinha o protegido? Como Vlad pensava e ele agia? Como essas coisas poderiam acontecer?

Seu braço mordido pelo cão estava sangrando um pouco e tinha ficado inflamado, mal podia mover o braço ou o cavalo dar um passo forçado e seu braço doía. Era uma dor insuportável, como se tivessem cacos de vidros dentro de sua pele, mas era apenas a inflamação.
Lembrou de seu irmão, de como tinha o deixado para trás. Não estava arrependido, não mesmo. Ele fez a escolha dele e eu a minha. Não posso, não devo me arrepender. Esta foi a minha escolha.

Imaginou que talvez, Radu estivesse sofrendo, pagando por sua audácia, mas na verdade o mais novo estava limpo, descansado e rodeado de bons livros.

A viagem fora cansativa, eles paravam apenas seis horas no meio da noite para dormir, tempo que vlad perdera mais da metade para conseguir fechar os olhos, graças ao seu braço e aos pensamentos instintivos. Eu posso tentar fugir, eu posso tentar correr. Mas no fundo ele sabia que apenas iria ‘’tentar’’, infelizmente o conseguir estava fora do seu alcance. Ele fora mordido, estava com fome, exausto, sem dormir. Não ia conseguir fugir.

Às vezes conseguia cochilar em meio a cavalgada, já que as enormes árvores recheada de grandes galhos e folhas cobriam os céus, deixando pequenos flashes de luz passar entre os pequenos espaços de uma folha e outra.

Naquele momento ele estava sentado, sentindo o andar do cavalo e quase dormindo. Os olhos estavam fechados mas suas orelhas (por mais que ele estivesse quase dormindo) estavam atentas.

- Abram os portões! – Ouviu um dos soldados que o escoltara gritar.

Essa não....Chegamos...

O barulho do enorme portão de pedra sendo erguido fora captado por suas orelhas e ele abriu os olhos. Voltou a fitar aquela entrada de pedra com esculturas demoníacas e um frio passou por sua espinha. Fazendo todo seu corpo arrepiar-se.

Cavalgaram até a entrada do pátio e um soldado veio ao encontro deles.

- Vlad Tepes III, que bom que está de volta!

Vlad abriu os olhos e fitou aquele soldado. Como odiou o tom de ironia e sarcasmo do homem e quis mata-lo, quis enfiar os dedos na boca dele e arrancar-lhe a língua.
O garoto não respondeu, simplesmente aceitou a ajuda para descer do cavalo e esperou.

- Temos uma grande recepção para você!

Vlad olhou para o lado e pra cima,  voltando a olhar o soldado maior que ele.

- Recepção? Isso não é uma visita.. Eu fui capturado, estava fugindo!- Sua voz foi baixa e rancorosa, como se estivesse arrependido do que fizera, mas talvez estava, se não fosse a descoberta. Preciso encontrar o velho depois. Se eu não morrer é claro.

Vlad fora escoltado até o portão principal. Olhou o mesmo sendo aberto e atrás dele, dezenas de soldados, serventes, escravos e todo tipo de pessoa que habitava o castelo, dentro do salão principal, olhou Radu sentando ao lado da esposa do Sultão e sentiu-se traído, trocado. Seu maldito, sua mocinha....

Mordeu os lábios de ódio, dessa vez queria ter outra oportunidade para dar um soco no peito do irmão. Mas dessa vez iria mata-lo.

O sultão estava em seu trono e levantou, caminhando em direção de Vlad.

- Vejam meus soldados, meus escravos, meus servos. Vejam este pequeno e ousado garoto.
 Vlad não abaixou a cabeça, permaneceu fitando o sultão.

- Vejam ele está sangrando, está machucado, gravemente ferido.. Tudo isso pelo que? Pela tentativa falha de fugir dos meus aposentos. Sendo que ele foi entregue pelo próprio pai!
O garoto sentiu um soco no seu estomago. Como se cravassem uma espada em seu coração. As palavras dele...São verdadeiras, não tenho o que contestar

Conforme o sultão se aproximava do garoto, ele aumentava seu sorriso insano e maldoso.

Vejam vocês com seus olhos! – Parou na frente do garoto, aumentando o tom de voz – O que eu vou fazer com o VLAD TEPES III, filho de VLAD DRACUL TEPES II

O Sultão rapidamente levou a mão gorda contra o rosto do garoto, esbofeteando com força, fazendo-o cair para trás. Vlad sentiu a dor, sentiu a humilhação e depois sentiu os dedos do gordo segurando seus cabelos.

- Vejam no que vou transformar esse grande garoto, ousado e forte. Assassino de canibais da montanha. – gritava enquanto começava a arrasta-lo. Vlad levou as mãos até os pulsos dele, ignorando a dor agora do braço inflamado, tudo para parecer menos humilhante enquanto ela puxado em direção de uma porta.

- Minha mulher! – Gritou para sua esposa – Eu a amo, eu sou fiel a você. Mas o castigo desse garoto será perder sua honra, irá perder seu orgulho. – Vlad sentiu seu coração apertar, sentiu uma enorme angustia.  O que ele quer dizer com isso?

- Vou faze-lo pela primeira vez na vida dele ele se sentir com vergonha, humilhado. Vou faze-lo de minha mocinha!

Naquele momento todo o silencio do local fora acabado, vozes de la para cá podiam ser ouvidos, gorgulhos, risadas, chingamentos. Todo tipo de besteira contra o garoto. Vlad olhou para a mulher do Sultão e ela sorria, satisfeita com o castigo. Eu não posso acreditar nisso, eu não acredito nisso.

O sultão parou diante a porta e abriu a mesma. Vlad descobriu que ali era o quarto de algum criado e descobriu que nunca deveria ter tentado fugir.
~~
Adrianópolis – Estado Otomano
- Padre Shaft, padre Shaft! – Gritou uma menina de doze anos, sua pele era branca e seus cabelos eram ruivos.
O padre alto, um pouco moreno e careca olhou para a jovem garota e sorriu.

- Diga minha pequena, o que está fazendo aqui? – O mesmo tinha um voz forte e calma.

- Minha mãe... Não sei onde está minha mãe! – A menina dizia em um tom inocente, mostrando que estava realmente perdida.

Os dois estavam diante a porta do monastério. O local era rodeado por árvores que davam direto a grande floresta.

- Vamos, venha comigo, vou ajuda-la a encontra-la.
A garota caminhava em direção do padre que realmente, tinha a intenção de ajuda-la, mas repentinamente um barulho no meio do mato fizera com que ela parasse.

- Não se preocupe minha garota, deve ser apenas um coelho, venha até mim! Vamos procurar sua mãe!

A garota estremeceu, olhou para trás e infelizmente descobriu que o que estava dentro da mata não era apenas um coelho. Coelhos não tinham olhos vermelhos como aquela criatura e não se movimentava de forma solene como aquele enorme lobo.

O padre se assustou e ao mesmo tempo se surpreendeu

Esses olhos vermelhos, essa pelugem negra.. É o diabo, o diabo veio até mim!
Repentinamente o lobo pulou em cima da garota, ele estava sangrando e tinha flechas por seu corpo. O lobo mordeu no pescoço da menina e deixou as patas por cima dos braços frágeis da garota. Tirou um enorme pedaço de carne do pescoço da menina e comeu, bebendo também todo o sangue que jorrava.

O padre Shaft permaneceu inerte, não sabia se estava com medo, se estava triste pela morte ou feliz pela descoberta.

Isto é um sinal...O diabo veio até mim...Ele não vai me matar, ele não me quer como inimigo, ele me quer como aliado.