Sedento por sangue
Os músculos pediam
por descanso, o cansaço iria vencê-lo. Cada passo dado era como se uma faca
fosse cravada em suas panturrilhas. Respirar nunca foi tão difícil para Vlad. E eu achava que meu mestre de armas era
exagerado, quando dizia que eu precisava me manter treinado. Que iria ter
querido treinar mais quando minha vida dependesse da minha condição física. Conseguiu
pensar enquanto esquivava-se das árvores desesperadamente. A lua estava
novamente no lugar do sol, uma lua cheia e luminescente, capaz de iluminar uma
grande parte daquele território Turco. Estava fugindo há quase doze horas,
nunca imaginou que poderia correr tanto, mas iria correr, correr até seu corpo
parar por conta própria. Não poderia se dar ao luxo de parar, sentar e
descansar. Não enquanto quatro cachorros brancos e enormes corriam em sua
direção. Não sabendo que caso fosse capturado, dessa vez o seu castigo seria
muito mais que uma pequena punição. A humilhação seria grande, monstruosa.
Sabia que não seria morto, não perderia nenhum membro, mas a humilhação seria
grande. Uma punição que o garoto nunca mais ousaria esquecer.
Seus olhos fechavam-se
por conta própria, estava exausto, com sono, naquele momento a fadiga era sua
pior inimiga. E o frio que sempre fora agradável, sempre fora sua amiga, agora
fazia o vento parecer laminas cortando seu rosto quando passava por seu rosto.
Os cães atrás de si
corriam e latiam, babavam de fúria e ódio. Vlad nunca imaginou que seria
possível de fugir de cães por tanto tempo. Contudo o garoto usou muito mais que
seu corpo, usou seu cérebro, escondeu-se entre escombros, conseguiu até matar
dois dos cachorros, mas isso apenas lhe deu mais tempo e fez com que ficasse
ainda mais cansado. Os soldados estavam atrasados, tentando manter o ritmo de
fuga, seguindo os rastros da fuga para depois que o garoto fosse pego eles os
alcançasse.
Sentiu uma dor forte
em seu peito, apoiou a mão em uma árvore e parou, olhando para trás e tentando
manter a respiração equilibrada. Nessa pausa de cinco segundos os cachorros se
aproximaram dois metros dele e ele sentiu o desespero tomar conta de si.
Virou-se e correu, não conseguindo manter os olhos abertos por mais de 10
segundos correu menos de dez metros e bateu o ombro em um grande carvalho,
fazendo com que seu corpo rolasse alguns metros no solo coberto de pedras e
galhos quebrados. Viu tudo girado e sentiu suas costas batendo contra outra
árvore.
- Arghh....
Encostou-se
rapidamente contra o tronco, sentindo a dor nas costas causada pelo impacto.
Naquele momento seu corpo cedeu ao cansaço. Sentiu que não conseguiria mais se
levantar, muito menos correr. Mal conseguia manter seus olhos abertos enquanto
os cachorros corriam (quase voavam) em sua direção.
Se esses animais desgraçados não me comerem vivo, agora
chegou meu fim. Talvez seja
melhor eles me comerem vivo, do que eu for pego e
levado ao Sultão.
As pálpebras cansadas
fechavam-se enquanto sua consciência era dominada pelo cansaço.
Até que um barulho
atrás de si chamava a sua atenção. Virava-se lentamente e seu corpo caia no
solo, enquanto sua visão turva fazia com que ele visse uma sombra negra de
orbes rubra se aproximando de si.
~~
- Como assim? Como
aquele pirralho fugiu? – Blasfemava o Sultão fitando de forma incrédula o
pequeno Radu. – Além de fugir ele te bateu e furou os olhos de dois dos meus
soldados?
Radu sentia-se
assustado, acuado. Fora atacado pelo seu irmão mais velho agora Mehmed gritava
enfurecido igual um louco com ele.
- Mas...Mas.. Eu não
tenho culpa senhor. – Respondeu de forma baixa e olhando para o chão.
- Não tem culpa sua
donzela? Seu coração mole de fresco fez com que ele saísse daquela prisão
subterrânea, quase te matou, cegou dois dos meus soldados e fugiu. Como a culpa
não foi sua?
- Mas sen..-
Infelizmente Radu não pode terminar sua pronuncia já que a mão gorda do Sultão
acertou em cheio a boca do garoto. O sangue voou para o chão e o menino caiu no
chão, mantendo as mãos fracas contra o tapete vermelho.
- Mas nada sua
donzela. Sua sorte que este tapete é vermelho, se não eu iria batê-lo mais
ainda por suja-la. Ela foi feito pelo melhor tapeçarão desse reino seu menina.
Radu contraiu o
choro, mordeu os lábios e sentiu o rosto ficar vermelho de vergonha. Ele era
todo o oposto do seu irmão, era fraco, medroso e nunca conseguia se proteger
sozinho. Era tão fraco que a culpa cairia em suas costas, enquanto o autor da
traição fora seu irmão. Vou odiá-lo, vou
odiá-lo.
- Isso mesmo, segure o choro. Está começando a aprender.
– Caminhava de um lado para o outro,
impaciente.
- Esse garoto..Ele
tem que ser pego, ele vai ser pego.. E o seu castigo.... Ele vai ter um
castigo... Vai ser humilhado. – Olhou para Radu e sorriu. – Ele vai ser pego e terá uma grande punição.
- Eu não me importo,
não me importo mesmo. – Respondeu o garoto, com os olhos fechados segurando as
lagrimas. Teve certa dificuldade para falar a primeira vez, mas depois suou até
de forma agradável.
- É bom que não se
importe.
~~
A criatura de pelos
negros caminhava cautelosamente em meio o ar gélido e reconfortante,
reconfortante para ele, já que seus pelos o mantinham aquecido. Andava sem
deixar pegadas ou barulhos, estava faminto, estava caçando a presa da sua
noite. Um coelho? Uma raposa? Não sabia ao certo, apenas sabia que precisava se
alimentar, seu instinto pedia isso.
O lobo negro caçava
sozinho, sempre caçou assim, fazendo da lua sua única e melhor amiga em meio às
caçadas noturnas.
Acreditou que aquela
noite seria como todas as outras, contudo surpreendeu-se quando se sentiu
atraído por algo. Não sabia ao certo o que era não tinha aquele doce aroma de
sangue, de carne, muito menos tinha aroma. Suas orelhas treinadas para ouvir
quaisquer que fosse o som, não tinha ouvido nada, simplesmente estava sendo
atraído por alguma coisa.
Caminhou ao leste,
seguindo seu instinto, preparando-se para o que iria encontrar. Sua barriga
ainda estava vazia, mas a necessidade de seguir aquela intuição era mais forte
que tudo. Em menos de cem metros de caminhada começou a barulhos diferentes,
não um simples barulho de outros animais passeando, mas gritos de algum animal
parecido com a sua raça, mas não eram lobos, ele conseguia reconhecer. Logo o
cheiro de pelo sujo dominava suas narinas, eram animais peludos, mas não eram
lobos.
O lobo negro de orbes
rubro rosnou e avançou em direção dos latidos, em direção da sua intuição, como
se algo o puxasse para lá. Conseguiu discernir um latido do outro, somando
quatro ao total. Esquivava-se das árvores com agilidade e pericia, era um
caçador, sabia como se movimentar sem chamar a atenção de suas presas, crescera
toda a sua vida fazendo isso.
Não demorou muito
para os olhos vermelhos fitarem uma criança caída no chão. Sabia que era uma
criança, vivera muitos anos, sabia disso e de muitas outras coisas. Ele não era
um lobo normal, outrora já teria sido, mas agora. Ele era um monstro criado por
outro monstro.
Os cachorros viam sua
presa caindo, acreditaram que agora, iriam mordê-lo. Não iriam mata-lo. Foram
treinados para morder, paralisar e soltar. Mas repentinamente uma criatura
negra emergiu das sombras, parecia com outros cachorros, mas ele era um pouco
maior, mais forte e seus olhos eram vermelhos como sangue. Os cachorros pararam
e rosnaram, enquanto a criatura negra parava na frente do garoto e começava a
caminhar de um lado para o outro, mostrando os caninos enormes e o olhar
sedento por carne, por sangue.
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