3: Decisão.
PS: Todos os grupos citados existém
O mundo é um filme que não para: Onde personagens nascem e morrem
a cada segundo. No mesmo momento em que um bebê está vindo a este mundo, com
certeza uma criança a milhares de metros de distância está sendo vendida,
abusada, torturada e humilhada pelo Tráfico de Humanos.
No mesmo momento em que um governador está chegando a sua mansão
no seu carro do ano, levando para sua família mais dinheiro do que eles
precisavam; um garoto de rua está vagando pelas ruas, com frio, usando uma
blusa suja que achou no lixo e uma calça cheirando a mijo. Normal, está usando
a calça mais de um mês.
A terra não para, as pessoas não param e o jogo de manipulação do
grande escalão continua sugando as almas das pessoas. E foi esse mesmo
pensamento que levou a Marlon tomar a decisão daquela noite.
No mesmo momento em que Artur se deslumbrava na festa com seu
padrinho e conhecera Alessa, Marlon percorria sua própria estrada, seu próprio
caminho e seria nesse dia que as escolhas de ambos iriam transformar tragicamente
a vida deles: Para melhor? Pior? Vou deixar você definir por si mesmo.
- Achei que ia ficar em casa, não consegue ficar um fim de semana
em casa? – Perguntou a mãe de Marlon enquanto fitava o jovem negro se arrumar.
Dona Maria era uma mulher morena de corpo esguio e corpo fino. Semblante
pequeno e olhos caídos, talvez cansados de tanto lutar e pouco ganhar (Normal,
estamos no Brasil). Contudo sempre tinha um sorriso solene quando se tinha
algum motivo, Não era uma mulher amarga, talvez um pouco cansada.
- Ficar em casa pra que mãe? Vou pro RAP RAP RAP – Marlon tinha
uma expressão jovial e animada. Mal tinha terminado seu café e já enfiara no
banho. Mal entrara no banho e já sairá!
- Vai pro seu rap com banho de gato é!
- Se eu demoro a senhora reclama que vai queimar a extensão. Se eu
tomar banho rápido fala que foi banho de gat..
Marlon não teve a oportunidade de terminar de fala. Sua mãe o
cortou antes.
- Ta bom menino, tá bom! Vai pro teu RAP RAP RAP do jeito que
quiser! – A voz dela suou tão fina e engraçada que fez Marlon rir, deixando
ambas as mãos sobre os joelhos e quase se debruçando.
- Como é Mãe? RAP RAP RAP – Marlon tentou imitar sua mãe mas tudo
que conseguiu foi deixa-la ainda mais nervosa.
- Vai, some daqui diacho e vai pra onde tu quer ir! Se cuida eim!
Se chegar em casa tarde vai dormir na rua!
- Tranquilo mãe. Vou chegar cedo.
– O moreno responde de forma tão calma e convicta que a coitada de sua
mãe acreditou.
- Tenta não me acordar. Amanhã vou trabalhar cedo!
- Não vou acordar a senhora, a senhora já vai tá acordada. E por
que vai acordar cedo?
- Eu vou trabalhar amanhã... É domingo mas pobre tem que ralar!
Marlon deixou o sorriso desaparecer do rosto. Era desagradável saber
que sua mãe teria que trabalhar em um domingo enquanto ele iria sair para uma
festa no sábado. Contudo...O que ele poderia fazer? Trabalhar sendo que está
prestes a fazer 16 anos ainda. Já pensou nessa possibilidade mas sua mãe não
deixara. Vai estudar, vai estudar! É isso
que eu quero que tu faça agora, estudar! A voz dela ecoava em sua mente
como se ela estivesse falando.
- Como assim? Já vou estar acordada menino? -A voz dela o tirou de seu devaneio,
quebrando a efêmera tristeza.
- Bem, vou chegar cedo mãe. Oito da manhã, nove por ai! –
Respondeu Marlon, deixando um sorriso que fez sua mãe ter vontade de quebrar uma vassoura na sua cabeça.
~~
- Como é essa fita? Salve Rima? – Perguntou Marlon curioso sobre a
festa que estava indo.
- É de RAP mano.. Tem vários grupos de RAP daqui da baixada que
vai cantar lá.
A Marina Pereira do C.E.S e o T013 vai tá em peso lá! – Renan era dois anos mais velho que
Marlon, branco e magro. Um pouco maior que um metro e setenta.
- T013? C.E.S – Perguntou Marlon perdido.
- Território 013 e Centro dos Estudantes de Santos e Região
- Hm...C.E.S entendi...E esse Território 013? – Murmurou Marlon, ainda sem entender direito.
- É como se fosse um tipo de grupo, Clâ, Guild, Tribo...É essa
fita ai mano!
- A tá entendi!
Ambos estavam sentados na poltrona dos fundos da lotação 42.
- Onde que é mesmo? – Continuou Marlon, querendo saber mais sobre
a festa.
- Perto do Extra. Quando
agente chegar tu vai vê! Mó brisa lá mano e tem uns cara que toca um
instrumental MONSTRO!
Marlon sorriu e olhou pela janela. O ônibus agora saia da Rangel
Pestana entrando na Ana Costal. Nesse mesmo momento Marlon olhou para uma
pequena feita para crianças brincarem de motoristas. Dentro dela havia uns dois
moradores de rua e novamente, sua felicidade esvaiu-se. Voltando á sua mente
que: Enquanto ele estava indo para uma festa, muito provavelmente outras
pessoas estariam passando fome, morrendo....
- Vish mano tá brisando? – Perguntou Renan depois de ficar
esperando a resposta de Marlon. Marlon nem tinha ouvido..
- O que?
- Vish.. Que louco.... Onde tá aquele teu amigo nerd?
- O artur?
- é Aquele que viajava nos
livros. Ele curte RAP também né? Achei que ele iria vim!
Realmente. Artur também viajava no Flow do RAP, mas teve que ir a
outro lugar. A conversa deles passavam por sua cabeça e percebia, que ali
algumas coisas iriam começar a mudar. Marlon insistiu para Artur ir mas seu
amigo disse que não poderia. Teria que ir a uma festa com seu padrinho e seria
muita desfeita ele não ir. Por mais que duas pessoas sejam amigos, a vida na
maioria das vezes sempre nós leva para caminhos diferentes. Por mais que
sejamos amigos, não gostamos das mesmas coisas, não temos uma mesma família, mesmo
trabalho, mesmas necessidades.. São essas coisas que atrapalham muitas amizades
que poderia ser duradoras... Mas ele sabia que uma amizade de verdade não
acabava por motivos assim. Por mais que aja distância um dia. Amigos são
amigos: Ao menos é assim com os verdadeiros.
Todo esse pensamento passou em menos de um segundo e logo Marlon
voltou a responder.
- É ele mesmo. Artur foi para outo lugar. Responsabilidade dele.
- Responsabilidade no sábado? Mano... O RAP é o RAP né! – Renan
respondeu como se quisesse falar, Não
troco o rap por nada.
- É né... Mas cada um é cad......
Repentinamente o ônibus parou fazendo com que os dois sentissem
seus corpos sendo jogados um pouco para frente. Não foi um acidente, mas uma
para brusca.
- PORRA MOTO! TÁ METENDO O LOCO! – Gritou Renan enfurecido.
- Desculpa, o cara parou do nada. – Respondeu o motorista em um
tom sem graça.
Renan não se deu ao trabalho de responder.
- É foda mano... Bora é no próximo!
Eles descerem em frente ao Extra da AV. Ana Costa e foram em
direção do começo da Av. Menos de uma quadra de distância havia dezenas de
jovens parado diante uma pequena casa. O som estava rolando e a fumaça pro ar
também.
~~
- Mano que brisa esse instrumental! Bem que tu disse! – Os olhos
de Marlon já estavam vermelhos e ele imaginou o que aconteceria se sua ......Não adianta pensar nisso. Que brisaaa!
Marlon e Renan moviam seus corpos de um lado para o outro enquanto
os Operários do Som faziam sua magica com seus instrumentais. Marlon sentiu o
Flow crescendo dentro da sua mente e a vontade de rimar quase explodindo. Era
algo que tava em sua alma, algo que crescia enquanto ele crescia e não
tinha como controlar ou esquecer. Eu quero cantar RAP!
Pensou o pequeno criolo brisando naquele som. Aquela vontade iria
se tornar meta em poucos minutos, quando ele ouvisse MC’S da baixada cantando
ali, na sua frente. Pessoas como ele, humanas como ele. A única diferença até
aquele momento era que: Essas pessoas tinham metido a cara, tinham se jogado
para agarrar seu sonho. ORA, EU SOU NOVO,
TEM TEMPO AINDA!
O tempo passou tão rápido que ele nem percebeu e de repente estava
ouvindo os MCS cantando. As atrações foram: DJ
CAMPEBEL, THALES PRADO, TON 013, THIAGUERA BRANDÃO, KTARSE, MAYARAH MAGALHÕES,
PRETA RARA, VOZ DE ASSALTO, CBD- CRIAS DA BAIXADA, SENSIMILLA JHON E CARAS, LOS
13’S
Marlon sentiu-se em um sua utopia. Estava ali, na frente de
pensadores, não faladores. Pessoas
convictas de seus sonhos e de sua vontade de falar o que não é o certo. Afinal
não é essa mensagem do RAP? Ser a voz daqueles que não são ouvidos? Transforma
o manifesto contra a corrupção, o
desleixo com a periferia e com a vida humana em Arte?
Naquele momento, enquanto as letras invadiam seu consciente, enquanto
ouvia as musicas sabia que era isso o que tinha que fazer. Odiava milhares de
coisas, mas quem não odiava? Contudo ele apenas não odiava: Não aceitava e
queria fazer algo contra aquilo... Então,
diante tudo aquilo, naquele lugar. Ele se decidiu.
Vou ser RAPPERS!
Depois de todos os Rappers cantarem. Marlon seguiu para o canal
dois. Logo entraria no 181 e voltaria pro morro, seu lar, sua paixão.. E
enquanto andava pelas ruas escuras de Santos observou algumas crianças de rua
transitando de um lado para o outro e uma musica que ouvira há minutos antes
voltou a martelar em sua cabeça!
A musica falava sobre o ridículo dos nossos governantes. Enquanto
pessoas morriam de fome, enquanto hospitais precisavam de reformas, mais
médicos, as periferias precisando de mais escolas e maior conteúdo de
aprendizagem.. Eles tavam organizando uma COPA DO MUNDO.. Tirando milhões
daqueles que realmente precisavam.
- Estou decidido..Não é mais objetivo..É META!
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